“A Mia é como sua melhor amiga (o).
Ela se faz ombro amigo desde o momento que vocês se encontram. Te conforta em momentos difíceis e vira sua muleta no dia-a-dia, sempre presente e atenta para te dar todo o amparo do mundo.
Ela te chama todo dia pra conversar por te amar e sempre querer seu bem, sempre disposta a te ajudar em melhorar quem você é.
Como a verdadeira amiga que a Mia sempre foi, ela te mostra maneiras de como curar seus maiores problemas, te apresentando a um mundo de novos meios que te livrarão das suas dores de maneira rápida e eficaz, nunca mais precisando se preocupar com eles.
A Mia explica então que, para ela, autoamor é magreza, ódio próprio é gordura. Então, é simples: ser magra é ter tudo, poder tudo, é ser finalmente feliz. É o estar abaixo dos 18,5 no IMC, o poder usar roupas 32-34, o ser a mais magra daquele lugar que vai te completar como mulher. É a peça perdida do seu quebra-cabeças.
Ela te mostra como chegar à linha de chegada desta jornada pela completude por meio de “métodos”.
Ela começa então propondo que vocês fiquem 24 horas sem comer para emagrecerem 700 gramas de um dia pro outro, mostrando logo após inúmeras maneiras de poder comer sem ganhar peso. Ela te introduz ao mundo das dietas e te deixa viciada em contar as calorias do teu prato de almoço. Ela te apresenta ao famoso “padrão de beleza” como figura de sucesso absoluto. Ela te guia em direção um caminho muito perigoso, mesmo que, pra você, este percurso é o única rota possível.
A Mia assim se torna a pessoa mais importante do mundo. Não há vida feliz sem ela, pois, sem sua ajuda, você nunca poderá ser o que você sempre quis: magra.
Mesmo que ela seja sua melhor amiga e maior confidente, você não entende por que as pessoas só a criticam. A Mia só quer o teu bem. Ela é a única que não te julga. Ela, pelo menos, tenta te ajudar. Então, de pouco em pouco, a Mia vai te isolando do mundo, pois, se o mundo não te quer com ela, você não quer mais estar com o mundo. Você depende dela e ela de você.
Nesse isolamento total, a Mia te leva à ansiedade, à distorção de imagem e ao medo da comida. Com o tempo, ela te transforma em outra pessoa. Alguém mais inseguro e medroso, te distanciando mais e mais de quem você foi. Ela vai tirando toda o seu senso de discernimento lógico, fazendo com que comer uma maçã já te leve aos prantos. A tristeza te consome por completo e, antes mesmo de você perceber, vocês viram uma só.
Juntas, pulam em um buraco muito fundo e sombrio. Você se vê presa no mundo que você e ela criaram e, mesmo que você quisesse sair, não há saídas a vista. É somente ai que você entende que a Mia nunca quis seu bem. Ela nunca te amou. Ela só queria ter você em seu controle. Ter você só pra ela e mais ninguém.
Entretanto, em meio à escuridão do poço, uma saída se mostra real. Uma mão se estende no fim do buraco, te levando para longe da Mia e, mesmo que a ela se use de todas as suas forças para te puxar de volta, a mão se mostra mais forte. Ele é único com força suficiente para quebrar o ciclo entre você e Mia: o amor verdadeiro.
Aquele amor dos seus pais, da sua família, dos seus amigos, do seu parceiro.
Aquele que te mostra a verdadeira felicidade: ser grata por quem você é. Aqui e agora.
Aquele que te acolhe como colo de mãe, nutrindo a alma e cicatrizando as feridas.
Aquele se consegue lutar contra qualquer um. Até contra a Mia.
Mesmo que não esteja curada, vejo esta carta como meu pedido de despedidas. Vejo agora que eu e a Mia não somos o par perfeito que eu achei que fossemos e, mesmo que nos encontremos no futuro, extingo agora a pessoa que eu me tornei, um ser híbrido entre o meu eu e Mia. Me liberto aqui da sua soberania e da sua soberba. Não vou mais me submeter aos seus abusos e ameaças. Deus sabe que, desta vez, é pra valer.
Obrigada por me fazer a pessoa que eu sou hoje.
Obrigada por me ensinar a dar valor às pessoas que me amam de verdade.
Obrigada por me ajudar a entender o que significa ser feliz.
Até nunca mais.”